quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Lamentação de Ícaro - Bruno Rodrigo



Sei que ao me aproximar demais do calor
a cera frágil que une as penas de minhas asas vão derreter
Sei que cairei sobre o teto de Poseidon, abrindo assim,
caminho e estadia eterna no alçapão de Hades

Mas mesmo assim,
Como não ser livre?
De que vale ser prudente e voar, quando na verdade
anseio por liberdade maior?

Ainda que eu pague com a vida
ainda que o mar me apare e me desampare para afogar
Mesmo que o voo seja interrompido
minha alma tem asas próprias, viajarei para outro lugar

Bobos são os que verão as minhas asas usurpadas
que lamentarão a minha queda, a minha morte
Há guerreiros menos nobres com sangue nas espadas
que em relação a mim, serão de menos sorte

As asas que me adentram para a história
são de água com sal
são as lágrimas que choro, juntamente
com este mar que me condena

E sim, me chamem de imprudente, irresponsável, desvairado
só não me chamem de covarde

O sol me atrai e eu vou
o calor me chama e eu irei
sentirei a cera por entre as penas
e assim, perderei a força que outrora fora mais forte que a gravidade
Cairei entre as espumas das águas
e a tsunami causada pelo impacto do meu corpo inundará uma cidade

Mas mesmo assim eu subirei
não quero tocar o céu
sei que isto não é possível
não quero apalpar os calcanhares de Apolo
nem abraçar o sol
quero apenas subir, subir...
viver a minha escolha ao máximo dos extremos
e como troféu, sofrer a consequência com a mesma extremidade
e assim, cair, cair, cair... cair

Zombem de mim pois, os que nunca sofreram uma queda tão grande
mas lembro aos mesmo que, ao contrário de mim, jamais subirão tão alto.